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A crítica, mesmo que injusta e, por maioria de razão,
quando imparcial, é indispensável ao artista, 

porque o obriga a reflectir, a comparar e, posteriormente,
a reestruturar-se, sendo-lhe sempre útil.”

Paul Planat, La Construction Moderne, 1987

 

Nada há de mais estranho para o cidadão comum, 

e mesmo para os críticos, do que a incapacidade
do autor diante da sua obra, uma vez acabada.
Paul Valéry

 

As incertezas e as perspectivas iluminadas, virtuosas, o interesse pela crítica arquitectónica, sobrepujaram-nos com estes cruzamentos estimulantes1. Contudo, continuamos estupefactos diante deste paradoxo contemporâneo. Na era do consumismo, tudo será agradável, belo e eficaz, desde que providenciemos que o mercado o assegure, que se trabalhe correctamente a embalagem? Sem qualquer outra referência discriminatória, a gloriosa incerteza da arte tenderia a fazer calar a crítica, a considerá-la como um exercício vil, condenável porque envolta nessa suspeição de impotência assinalada extraordinariamente por Flaubert ao afirmar, zombando, que se “faz crítica quando não se consegue fazer arte”? De modo mais amplo, este estado de fragilidade da crítica, especialmente arquitectónica, não constituirá o sintoma de um final de época: a do predomínio da ciência, ou mesmo de um positivismo mais predisposto a comprazer-se na obstinada e infinita dissecação – do que no esforço de pensar globalmente a qualidade de uma obra? Se, como afirma Collins, a profissão de arquitecto não integra profissionais da apreciação, será inevitável, por isso mesmo, considerar, como muitos o defendem2, que esta ausência de actividade seria propícia a tornar ilegítima toda a crítica elaborada por não arquitectos? Sem ligação ao meio, não seria a crítica suplantada pelo que tem tendência a tornar-se nos lugares comuns contemporâneos: a avaliação, a comunicação? Será que esta reserva crítica não nascerá das entranhas desse “ventre flácido contemporâneo” da opinião, que consiste em simular a tolerância e em deixar desfilar as produções que afectam as paisagens urbanas porque “é democrático”, porque não é necessário realçar as angústias das infelicidades3, porque não se é obrigado a perder-se em avaliações que seriam de seguida, mais ou menos renegadas, porque a separação entre as práticas e os sufrágios (os únicos que fundamentam a crítica) pressupõe uma armadura teórica legítima com ligações por vezes claras (Benedetto Croce e Bruno Zevi), menos legíveis actualmente, razão, entre outras, de não sabermos a que santo padroeiro da avaliação nos devemos devotar?

A crítica levanta problemas porque parece conhecer fortes flutuações históricas, mas também porque, provavelmente, se interroga e duvida daquilo que o coração dita. Propomos ocupar-nos destas duas vertentes, não sem relacionar a questão das dificuldades com a necessidade em as superar ou exceder ou ultrapassar para lhes redescobrir o encanto.

 

Posicionamentos “políticos” da crítica arquitectónica

Colocar entre aspas a noção de política visa sinalizar, alertar e reencontrarmo-nos com Marcel Cornu4. De modo algum entendida no sentido da sociologia política, a ideia de política reenvia-nos para uma visão mais antropológica da existência social; tudo: ideias, edifícios, indústrias... por conseguinte, a avaliação de um produto arquitectónico emerge num contexto social, encontra-se afectado, “preso” numa conjuntura única. De facto, podemos questionar-nos se o mundo dos arquitectos não se encontrará numa encruzilhada de caminhos. A recepção da crítica pode contribuir, por um lado, para a consolidação de um universo de confrades, para a pacificação e a legitimação comunitária do corpo de arquitectos (contra os mestres de obra, as grandes empresas...); mas, por outro, a crítica não os desagregará ao reproduzir uma classificação? Não constituirá a crítica uma forma de ameaça para um “estado” arquitectónico instalado, utilizadores e produtores tentando ter influência, segundo as suas conveniências, sobre as produções e as transformações do mundo a criar? Não esteve o arquitecto agarrado ao pelourinho nos anos de 1970, em consequência de uma fraca atenção aos habitantes? Ele foi igualmente posto em causa por uma supremacia económico-tecnológica, discutível, do estaleiro de obras. Não terá dolorosamente sofrido uma espécie de desclassificação social, em simultâneo com a drenagem dos mercados dos anos de 1995? Com o fim do Estado Providência – grande fornecedor dos mercados –, com o fim das classificações com referência aos grandes prémios académicos e com a chegada dos arquitectos europeus em ruptura com as técnicas mais performativas, não nos encontramos seguramente no crepúsculo da história dos arquitectos, mas eventualmente na alvorada de configurações produtivas que se anunciam mais ou menos problemáticas. Esta crítica que tem o cuidado de se manter afastada das polémicas do campo dos profissionais não pode conjurar-lhe o risco. Tentar libertá-la é orientar o trabalho do crítico para a arquitectura e para as suas obras, e inscrevê-lo em dois sentidos socialmente opostos, inspirados por duas orientações políticas diferentes.

 

Uma política anacrónica da crítica arquitectónica

 

“O tempo é o arquitecto. O povo o seu pedreiro.”

Victor Hugo

 

Esta crítica vê-se transportada – ou exilada – por uma diacronia que a afasta do tempo do surgimento do edifício visado pela crítica. Esse tempo que passou desagrega as circunstâncias que tornavam o mesmo inteligível, sem dúvida, e simultaneamente, bastante próximo, pelo facto de emergir de uma “ganga comum” repleta de conflitos de comunidades de decisão, de orientação e de gestão da sua construção, de colaborações e competições que presidiam à sua concepção e à sua construção. Os protagonistas que poderiam desenvolver controvérsias a esse propósito já cá não estão... ou estão muito simplesmente cansados e velhos, não liderando já o mesmo renhido combate para “ocupar” uma posição na comunidade arquitectónica. O lançamento de um produto, o surgimento de uma obra constitui um momento privilegiado e delicado para todos. E se, para Hugo, “ser contestado é já ser constatado!”, a crítica positiva, todavia, revela-se um melhor augúrio do que a outra. Ser apoiado pela crítica que representa um público ou um produto constitui uma etapa necessária na elaboração de uma obra. E tudo se concilia nos textos que apresentámos para sublinhar os obstáculos, as dificuldades que surgem quando, à controvérsia, se junta a polémica5. “Levar tempo” a formular um juízo consiste em evitar fazer ondas, em seguir a opinião pública levado pela surpresa, pela novidade, por uma emoção fugidia... De resto, esta perspectiva anacrónica sublinha a renúncia crítica ao pretexto de que “não é fácil, quando se visita uma exposição de arte, exercitar o humor ou a crítica impiedosa [...] as palavras passam, a obra permanece e o momento da justiça chega6”. Em suma, esta política anacrónica da crítica permite à História julgar, digamos assim, compor “a sua obra”. Para retomar André Comte-Sponville7, ao ser necessário considerar a tradição como juízo, como história avaliada, pensamos mais em avaliação instituída, no sentido em que se impõe socialmente, em reputação, resumindo, numa opinião dominante, numa fama atestada que pode – a maior parte das vezes, mas não sistematicamente – apoiar-se em avaliações bem fundamentadas.

A fragilização do crédito dado a esta política conservadora da crítica, adviria sobretudo do facto de que a modernidade acelera a produção arquitectónica, bem como a obsolescência e o desaparecimento de diversas obras modernas. Mostra-se igualmente ultrapassada pela ascensão de todo o património que tende a afectar um valor atribuído a qualquer obra, porque se constitui no quadro de existência dos antepassados para aqueles que se sentem em dívida; habituámo-nos a desembaraçar-nos, se não mesmo a libertar-nos, da conservação de memórias construídas. Tal funcionaria, à semelhança de um depósito de sedimentação, sem razão aparente. Correcto ou não, o registo final não esclareceria os processos através dos quais a obra seria consagrada como tal.

 

Uma política progressista da crítica arquitectónica

Neste caso, a crítica exerce-se de imediato, em sincronia com o surgimento do edifício; tratar-se-ia, então, de interrogar a hipótese de uma possível “insularidade da crítica” em relação com a conjuntura social na qual emerge o edifício, o lugar, o produto arquitectónico; a avaliação poderia ser ameaçada, neste caso, fracassar frente a dois irredutíveis obstáculos. 

O primeiro obstáculo leva a enganarmo-nos excessivamente por razões diferentes. Numa primeira fase, por ingenuidade, o crítico encontrar-se-ia preso à opinião dominante, aderiria ao gosto do tempo, ao que encanta ou, muito simplesmente, tenderia a avaliar as obras como se tivesse a garantia de que com elas tivéssemos encontrado a pedra filosofal da arquitectura. Cada um poderia descobrir juízos proferidos de maneira peremptória e que se encontrariam totalmente condenados alguns anos depois. Em seguida, a avaliação seria animada por uma “intenção estratégica segunda”, para usar as palavras de Ève Chiapello e de Luc Boltanski8. Objectivo estratégico que seria alterado por intenções inconfessadas: fazer-se amar, fazer-se vender, fazer admirar ou fazer-se admirar... Objectivo manipulador, aproxima-se da denegação da crítica, para se dedicar a fortalecer um fenómeno social de reconhecimento, o círculo de cúmplices, e não um público exigente estimulado pela obra, mas sobretudo adeptos fiéis, lóbis... Em suma, ameaça sucumbir a uma hagiografia promocional denunciada por Bernard Huet ou Michael Ragon e que leva Frédéric Edelmann do Le Monde a organizar a sua “kénose”, a “sua fuga para o deserto” para escapar às armadilhas dos arquitectos9, problema que não pára de importunar estes autores.10

O outro obstáculo ergue-se em redor de uma crítica sem concessões, tornando irracional uma “questão” controversa. Muitos insistem nas distorções e nas relações de princípio que participam de uma outra erosão da crítica. Como escreveu Pierre Vago11 “felizes por serem publicados e, indubitavelmente, por serem elogiados, não suportam a menor reserva... Já tem acontecido que uma crítica deste género provoque reacções... chegando mesmo à recusa em revelar as futuras obras do autor ofendido. Ora, tal é privar uma revista de arquitectura do seu pão quotidiano12”. A crítica põe igualmente em causa os interesses económicos. Sempre segundo o mesmo autor, “existem igualmente os interesses e os ‘direitos’ das empresas, dos fabricantes de materiais ou detentores de sistemas de patentes, que constituem um embaraço não negligenciável, não apenas porque o equilíbrio de qualquer revista assenta em grande parte na publicidade, mas também porque uma crítica pode constituir, em algumas circunstâncias, um prejuízo de ordem comercial podendo dar lugar a perseguições e a exigências com perdas e danos.”

Então, provavelmente, reorganizam-se os mecanismos dramáticos da “questão” no sentido em que Luc Boltanski13 nos demonstra que este modelo de acção irá resvalar da esfera social para a do litígio. O artigo crítico não é apenas um juízo baseado em argumentos resultantes de uma deliberação serena numa comunidade de pares, mas uma injustiça construída como uma denúncia pública, assumindo a opinião como testemunho, ameaçando o crédito do arquitecto, o seu acesso aos mercados, etc. O organismo que acolhe nas suas colunas, críticos sem concessões... vestiria o fato de denunciante. O construído, tornado alvo da crítica, metamorfosearia o arquitecto criador em vítima. O terceiro protagonista, o censor, autor do juízo crítico publicado, assumiria a aparência do ofensor, do persecutor. Esta “questão”, que pode instalar-se no centro da política da crítica progressista da arquitectura, representa claramente um conflito, uma disputa, já que o ofensor e o censor defender-se-ão por sua vez, tentando demonstrar, com provas acumuladas a seu favor, que ao contrário de um preconceito por “ajuste de contas”, se trata da defesa da qualidade arquitectónica, do interesse de todos. Quanto ao último actor da questão, o avaliador, pode ser diverso: “a vítima”, antes de mais, que faz justiça pelas próprias mãos – é o sentido da primeira citação de Vago; ou, mais vulgarmente, utiliza a justiça, o que ilustra a segunda reacção assinalada por este autor.

 

Poderemos nós construir uma exterioridade da crítica?

De facto, até este momento, encontrávamo-nos diante de uma posição pouco clara. Após o período de entronização do capitalismo, “as actividades literárias e artísticas mantiveram-se à margem [...] ou entraram em oposição entre si, a obra de arte sendo para construir e por princípio sem preço, mesmo que as necessidades materiais obrigassem a propô-la a um mercado14”. Porque, assente num registo estético, a bela criação para qualquer génio muitas vezes maldito, sagrado, vadio (que nada quer)15, desconhecido, inscreveria as obras fulgurantes no mais puro desinteresse. Esta atitude constituiria posteriormente a admiração da intelligentsia. Mas, a situação alterou-se substancialmente na primeira metade do anos de 1980. Os críticos da autenticidade “contribuíram para desacreditar a rejeição artística dos bens de consumo, do conforto, da ‘mediocridade quotidiana’ – assimilada a uma pose fora de moda – e mais comummente a libertar numerosos intelectuais daquilo que para eles era, nos anos do pós-guerra, simultaneamente um constrangimento ascético e um ponto de honra: o desprezo pelo dinheiro e pelo conforto que o mesmo proporciona16”. Resumindo, todos estão integrados no mesmo mundo capitalista, aquele que é dominado pela moral do conforto e do desafogo que propõe. Algumas destas franjas sugeririam a impossibilidade da exterioridade, os embaraços da perda – força eficaz de suavização, do aniquilamento da perspectiva crítica. Importará então verificar, nesta estratégia de incorporação num sistema, a assinatura do certificado de morte da crítica artística, e especialmente a da arquitectura?

Longe de nós a ideia de que todos estariam limitados a estas duas gamelas. A invocação apenas das dimensões sociais é insuficiente para dar conta da letargia da crítica arquitectónica. Uma outra razão que escapa ao que poderíamos chamar uma sócio-crítica, interroga directamente a capacidade de julgar.

 

 

EM REDOR DE UM CÍRCULO VIRTUOSO DA CRÍTICA

 

Interpretação

“Aquele que é capaz de interpretar uma obra construída, adoptando este ou aquele ponto de vista, pode enriquecê-la, pode conferir um estímulo complementar à referida obra”, afirma Jürgen Joedicke17. Sem entrar numa chicana retórica, antes de mais reconheçamos, a par de Pareyson18, que a avaliação não é de modo algum uma interpretação. Esta última constitui um modo de contemplação activo, criativo. Esta relação implica uma “actividade intensa e laboriosa”, que trabalha sobre a conversão dessa pessoa estranha à obra num público; esse público pode ser visado pela obra, integrado na própria obra... “A interpretação, enquanto actividade, é desejo de conhecer e esforço de atenção e, por consequência, inspecção infatigável e difícil de contentar, abandonada à incerteza das tentativas para o fazer...” Assim, este processo de apropriação de um obra arquitectónica pode activar, perpetuar a capacidade criativa daqueles que a frequentam, os habitantes que a ocupam. Não é desta interpretação que se trata quando Philippe Boudon analisa Pessac de Le Corbusier19 e descobre como os habitantes, cada um à sua maneira, o actualizaram conferindo personalidade à obra; e para retomar Eupalinos, “o belo empurra-nos, conduz-nos a um qualquer lugar: ao recriar pelo menos em nós, pela contemplação, a forma bela, tornamo-nos arquitectos”. Esta acção é perfeitamente comparável a uma reinterpretação contemporânea de Medeia ou de um trecho de Bach. Mas não é nisto que se pode basear, a nosso ver, a crítica.

 

Vias de identificação da obra

 

“Diz-me [...], não reparaste, ao passeares por esta cidade,
que de entre os edifícios que a povoam, uns são mudos,
outros falam, e outros, enfim, mais raros, cantam?”

Paul Valéry, Eupalinos ou l’architecte, 192420

 

Como o testemunham muitos autores que aqui se expressam, aplicar esta faculdade de avaliação não se reduz tão-pouco em contentarmo-nos em falar de gosto21, que mais não faz do que assinalar a emoção ou afirmar as nossas preferências. Se a expressão brutal de Kant da rejeição do gosto encerra uma via, parece-nos contudo interessante retomar a questão da nossa confrontação complexa com a obra de arte22: frente-a-frente, sob o nosso olhar.

 

A via pragmática de John Dewey23

A via de um criticismo kantiano não terá tido como consequência colocar a arte algures, num mundo de privilégios, de “liberdade” absoluta? Concebida como uma espécie de desvio do espírito dos génios, que oferecem normas forçosamente inéditas e originais por definição, este tipo de arte adopta estilos sagrados, que as sociedades colocariam à margem, nos museus, nos teatros ou nas salas de concertos, vindo a ser até mesmo consagrados pela “museificação”. As obras seriam admiradas socialmente pelo facto de, deste modo, se subtraírem ao gosto do cidadão comum, propostas à apreciação e ao deleite apenas das elites, tornando-se sagradas e, daí, intocáveis. Dewey denuncia o conluio deste pensamento com o crescimento do capitalismo que “teve uma influência primordial na evolução do museu como centro para acolher as obras de arte e na ideia de que estas devem ser separadas da vida quotidiana”24.

Nesta tarefa que visa fazer descer a arte do Olimpo, cuja crítica kantiana, douta, parece ter contribuído fortemente para fazer erguer, Dewey defende que, pelo contrário, as obras não se revelam como tal “senão em acto, na dinâmica viva da experiência”, a qual se resume na “interacção de um organismo (e não apenas do sujeito mental) com a sua envolvente, uma envolvente bastante mais humana do que física que inclui os elementos fornecidos pelas tradições e pelas instituições, bem como o contexto imediato”25. A uma galeria de produtos artísticos ordenados, sacralizados e submetidos a uma apreciação analítica e sábia, Dewey opõe, como inspirador pragmático, a relação fulgurante e vívida, que faz sentido a cada um sem que, por isso, constitua um prazer fragilizado. Esta experiência, em que “a passagem da perturbação à harmonia é o momento da vida mais intenso”, seria mais um momento efémero, instável, mas, a seus olhos, necessário porque nem o caos nem a repetição de uma mesma experiência conseguiriam manter a intensidade do deleite estético.

A crítica de arte, e especialmente a da arquitectura, não saberia fazer a economia desta experiência pessoal, ontológica e sensível. Nada mais ilustrativo do que esta reflexão de dois elementos de um júri de um exame numa escola de arquitectura, o director e um professor de projecto, na véspera da apresentação. “Vou colocar-me ali, no lugar de um visitante, que não conhece a escola, que pretende ir à biblioteca, e faço o percurso. A maneira de entrar no projecto, é a de contar histórias possíveis, de criar vários cenários, de ver como isso se desenrola, o que é que se encontra no percurso [...] Poder-se-ia pensar que se trata da funcionalidade, mas não é apenas isso, porque enquanto me dirijo para lá, sinto um prazer de arquitectura – o que é que atravesso como espaço? Se estiver num corredor, numa escada monumental, será que sentirei a luz, o ar fresco?” Noutros termos, a arquitectura deveria ser apreciada como indústria arquitectónica26 favorecendo uma dinâmica cinética útil e funcional, como espaço que estimula o prazer dos sentidos27, suscitando o agrado ou não; a sociabilidade, a convivialidade, a urbanidade.

Sem menosprezar Kant nem os seus émulos, este género de crítica permitiria situar a recepção e a apreciação, os ecos do sentimento vital nesta relação íntima e necessária. E encontramos alguns aspectos deste contributo no nosso ponto de vista final. Por essa razão, não poderíamos reduzir a crítica arquitectónica à cintilação, à magnificência e à vivacidade da arte. É essencial procurarmos esforçadamente explicar esta passagem, a qual não se opera com um objecto qualquer, mas precisamente com uma obra. A única afirmação de uma vivência perturbadora, transbordando de emoção, de estímulos e de entusiasmo, se conseguir responder a expectativas psicológicas no domínio da arte, não é suficiente para delimitar o sentido da obra numa perspectiva antropológica. Contudo, reteremos que o acesso à obra de um produto arquitectónico não pode ser encarado sem esta experiência, esta mesma experiência é um dos componentes da própria obra.

 

Uma via antropológica europeia

Na verdade, o crítico deverá ser um homem de cultura, que dispõe de um conhecimento sem lacunas no campo da arquitectura, mas seria uma cruel ilusão crer que a erudição constituísse a condição necessária e suficiente para ser um crítico competente. Nesse caso, porque não atribuímos nós a todos os historiadores de arte e de arquitectura, a todos os arquitectos um certificado de críticos? De facto, as dificuldades da crítica arquitectónica – e mais amplamente da crítica – relevam, em parte, de uma fragilidade a nível da teoria estética, da incapacidade que temos de definir o que fundamenta a harmonia. A atitude crítica e a boa fundamentação de um juízo subentenderiam um referente, “um material temático”, dito de outra maneira, enfim, não seria necessário dispor de uma concepção coerente e minimal da obra? Pretendemos, nas poucas linhas que se seguem, problematizar esta fragilidade, de modo a distanciarmo-nos relativamente à opinião de Kant28.

Uma questão prévia. Espantamo-nos, ao ler os críticos, com a disparidade construtiva das obras. Tanto percepcionamos um produto limitado, específico, como o conjunto dos romances, das peças, das pinturas ou dos edifícios de toda uma vida de criação. No fundo, não seria esta a marca de uma diferença29 – o estilo é o homem – que reteríamos como princípio implícito da sua definição? Tratando-se de arquitectura, de concepção da forma do espaço, não poderíamos falar de obra a não ser que o trabalho anterior do autor fosse respeitado. Do mesmo modo, é necessário entender o “ataque” dirigido a uma obra de arquitectura como visando inevitavelmente o arquitecto; este não pode, de facto, reivindicar senão a posição de autor, pois se ele admitir ter submetido o seu projecto a todo o tipo de pedidos, então perderá a sua dignidade e a sua legitimidade de criador. De onde, a contrario, a impossibilidade de acontecer uma outra obra – enunciada, contudo, por Henri Lefebvre no seu tempo30. A afirmação segundo a qual “a cidade é uma obra”, ao aproximá-la da obra de arte mais do que do simples produto material, transformou-se numa pura petição de princípio para a crítica arquitectónica que menospreza ou não reconhece totalmente a cidade como objecto nas manifestações dos seus juízos.

A obra instauraria um mundo endocêntrico. Que quer isto dizer? A obra arquitectónica organizaria a construção de outra maneira; com ela, o edifício tornar-se-ia edificante, criando por aí um universo auto--referenciado que o “sublimaria”, quer dizer, o transcenderia, o elevaria acima dos limites comuns31. Propomo-nos analisar dois aspectos que permitiriam discernir esta unidade estética. A mesma não se reduziria a uma finalidade utilitária, funcional, pragmática. De forma semelhante, a caligrafia produz signos, palavras, mas elabora ao mesmo tempo um universo plástico outro que pode “encantar” o leitor ao ponto de o tornar cego ou esquecido quanto ao sentido da mensagem escrita. Do mesmo modo, o poema de Max Jacob32 transporta-nos num repente para um mundo que não é o da designação pragmática. O poder do ritmo sonoro embala-nos e engana-nos. Escapamos de um universo real ou familiar para nos aventurarmos algures. A derivação foi operada pela coerência fonética, ritmada e rimada, que se insinua e impõe, exclusiva do outro.

“A obra instala um mundo... quando a obra de arte em si se ergue, então abre-se um mundo no qual ela mantém por muito tempo o reinado. Um mundo, não é apenas o conjunto das coisas dadas, enumeráveis e não enumeráveis, conhecidas ou desconhecidas. Um mundo, também não é um quadro figurado que acrescentaríamos ao somatório dos dados adquiridos. Um mundo ordena-se em mundo, sendo mais do que o palpável e do que o apreensível, onde nós nos julgamos em nossa casa”, sublinha Heidegger33. Este mundo pode ser qualificado como endocêntrico. Porquê? A obra descobre em si mesma o seu próprio objectivo, depois aguarda por uma coesão sem referência a um modelo externo, concebe os seus princípios de ritmo, de ligação, de retorno, de forma... das quais retira as suas propriedades e as suas referências, a obra será auto-suficiente! O sentimento é confirmado especificamente pelo arquitecto suíço, professor e criador contemporâneo Peter Zumthor que, regressado de uma sensação estranha vivida durante o processo de concepção sublinha: “Não me tinha apercebido daquelas concomitantes rigidez e doçura, daquela qualidade lisa e simultaneamente rugosa, daquela presença cintilante cinzenta e verde que emanava dos blocos de pedra. Por um momento tive a sensação de que o nosso projecto nos tinha escapado e se tinha tornado independente, pelo facto de ter assumido uma realidade material que obedecia às suas próprias leis.34

A obra arquitectónica resultaria de verificações estéticas. Não haveria um único registo “da” beleza, e esta afirmação conduz-nos à radical denegação de uma concepção puramente lógica da obra35. Seguindo um tal caminho, encontramo-nos na companhia de autores (R. Bastide, Luigi Pareyson, Jean Gagnepain36) que colocam em questão o facto de a estética não ter senão apenas uma acepção. Da nossa parte, postulamos intenções estéticas: poética (mobilizando a linguagem como no exemplo evocado de Max Jacob), plástica (que resulta da ordenação dos elementos), coral (no sentido de reuniões cerimoniais e festivas37 que celebram o prazer de estar em grupo), heróica (como que fundada na superação dos limites habituais – por exemplo a catedral de Florença – daí o sublime38). Uma das complexidades, bastante singular, da obra arquitectónica assentaria no facto de que ela poderia resultar do cruzamento ou da ordenação de quatro capacidades estéticas diferentes. Dito de outra maneira, não tenderia ela, pela mesma razão que seguiríamos trabalhando na obra com base no enunciado destes registos estéticos, a alargar a concepção que vem directamente da arquitectura, ou seja, a estabelecer hierarquias de cumprimento segundo satisfizesse um ou vários mundos de harmonia? De resto, não terá Paul Valéry entreaberto a porta a uma hipótese semelhante ao indicar que a obra arquitectónica encontraria a sua plenitude quando cantasse (ou fizesse cantar os homens39)?

Então, como elaborar uma avaliação bem fundamentada? Seguindo Pareyson, o juízo consiste em decidir se existe obra ou não a partir do momento em que existe coesão, adequação entre “a obra tal como se apresenta e a obra tal como desejava ser”, e para retomar a formulação romana, a mesma supõe identificar “a teleologia imanente da forma”. Por conseguinte, expressar um juízo para deliberar sobre a existência de uma qualquer obra ou de uma obra de arquitectura suporia, simultaneamente, uma capacidade quase hermenêutica de discernir o que pretendia ser aquela obra, quais as intencionalidades que urdiram esta coisa tornada mundo (plástico, heróico, coral...) e qual foi a conclusão quer da intenção quer do produto final; e a dimensão da adequação ou do afastamento entre os dois não permitiria fundamentar um juízo? Semelhante concepção da crítica interditaria, àquele que se lhe consagrasse, de aplicar ao produto a avaliar os seus próprios referentes, mas obrigá-lo-ia a descobrir o “material temático” (ou referente estético) criativo. O a propósito e a legitimidade da crítica adquiriria apoio e força nessas aproximações dos princípios endocêntricos, supostos organizadores activos na elaboração e instauração da obra. Se os considerandos de semelhante deliberação fossem possíveis, então o juízo não poderia ser único? Seria esta a única porta, também estreita, no desenvolvimento da crítica de arquitectura? Seja como for, a exigência de clarificação revela-se necessária para permitir um novo passo em frente da crítica.

 

A NECESSIDADE INCONTORNÁVEL DA CRÍTICA 

 

Uma crise de sentido da crítica actual

A arquitectura moderna preocupada em devolver o reino da beleza ossificada, pregada por Vignole, às masmorras, ter-se-ia tornado obsoleta pelo simples facto de que oferece um primado quase exclusivo à utilidade (a arquitectura reduzida a utensílio), à funcionalidade, à eficácia, à comodidade, à celeridade. A insatisfação dos cidadãos, dos habitantes relativamente ao património dos trinta gloriosos40 poderia ser vivenciada como escape de um género de “época do vazio” plástico. As formulações críticas poderiam estimular, espicaçar os debates, sugerir proposições, orientações para a criação arquitectónica. Esse debate, amorfo no dizer de muitos, poderia suscitar controvérsias sobre as marcas de referência críticas, sobre as propriedades estéticas, sobre as doutrinas, os modelos susceptíveis de representar ideais de qualificação dos edifícios, convidar à pesquisa, às alusões estéticas, ainda que a crítica tenha vocação para fazer a triagem e denunciar as ilusões. Mas a outra portada da crise da arquitectura abre-se também para as doutrinas que se mantêm frágeis, diversas, menos sujeitas a grandes controvérsias. Quem diz doutrina, diz referências que legitimam uma conduta da concepção arquitectónica, da acção41. A crítica poderia assim organizar-se partindo da doutrina para apreciar a obra e deste modo desacreditar ou legitimar a pertença do autor à escola e ao estilo de referência.

 

O processo da concepção e da recepção

O primeiro público da obra prestes a despontar, no dizer de um teórico como Pareyson, o criador laborans42 de uma obra arquitectónica, é também ele o primeiro crítico da mesma. Mas tal pressupõe precisamente uma grande virtuosidade e também uma grande entrega do artista, e mais especificamente neste caso, do arquitecto! Não deveríamos nós colocar no centro daquilo que se elabora o habitante, o usuário e contemplador que, reconhecido, poderia retirar prazer, estar à vontade, ver sublimar, transcender o seu quotidiano rotineiro para fazer cantar o seu quadro, metamorfosear a “sua célula”, num templo da existência, e evitar “emparedar-se vivo num mausoléu”43. Porque o entusiasmo, a vontade (como prazer legítimo) de conceber as formas como modo de colocar até mesmo o problema, como sugestões, devem ser purificadas das suas escórias, de modo a melhor libertar esta “teleologia imanente da forma”, ordenadora do conjunto construído à revelia do autor. Este “querer arquitectura” harmoniza-se, sem ser submergido nem inibido, com uma dúvida metódica e crítica, para decidir sobre a dinâmica da concepção in progress.

Mas a obra aberta, para retomar Jean-Luc Nancy, deve poder mostrar-se generosa, dialogar com aqueles que a recebem. Podemos, de novo, fazer uma aposta na arquitectura moderna: o público submeter-se-á, será conquistado pela pertinência da instalação arquitectónica construída. Por certo, a obra constitui em si mesma um outro mundo, auto-suficiente, endocêntrico forçosamente problemático, mas a aposta da conquista final do público é igualmente a da transformação da dupla construído/utente como obra. Deste modo, este tempo intermédio dito da apropriação é sentido como uma violência alimentada de um forte sentimento de prejuízo, de perda, uma falta de respeito, de deferência face àqueles que instalaram um modo patrimonial que adere ao quadro envolvente.

 

O lugar da crítica de arquitectura na actividade do ensino44

O exercício da avaliação, concretizado na correcção, é sentido como um procedimento difícil para o professor, porque se trata de um momento de manifestação da sua distância axiológica e da pregnância da crítica na relação com o aluno. Esta atitude entra em ruptura com um tempo, não muito distante, em que o ensino da arquitectura consistia, muitas vezes, em acelerar a inventividade sem que houvesse apreciação crítica sobre o projecto. Esta actividade crítica revela-se mais uma vez difícil porque a tendência contemporânea assenta mais na licença, na autorização do que na abstinência e na reticência. Contudo, o exercício da nossa dimensão ético-moral deveria constituir uma preparação constrangedora que conduzisse a um esforço exigente de concepção, de crítica, de recomeços a fim de polir a obra a haver. Por vezes manifesta-se nas propostas dos professores como um vislumbre de inquietação, de culpabilidade como se a “correcção” assumisse a aparência de uma acção “pedagogicamente incorrecta”. Convém recordar a passagem obrigatória pela crítica que decide, pela via exigente do trabalho a fazer para depurar e qualificar o projecto, para uma melhor compreensão daquilo que se introduz na obra na ignorância do criador, nesta marcha em frente em direcção à arquitectura.

 

Lacunas mediáticas

Consulte-se a Wettbewerbe Aktuell45, publicação mensal, e aí se verá a apresentação de todos os concursos de arquitectura que se lançam da Saxónia a Schleswig-Holstein, de Brandemburgo à Baviera. Nenhum escapa! Sob a autoridade e a assinatura do presidente do júri, e um relatório justificativo da escolha, são propostos aos leitores os nomes dos membros do júri: é apresentado o primeiro prémio e o conjunto dos outros concorrentes, com imagens dos projectos e argumentos apreciativos. Os profissionais, os estudantes lêem tudo; estes esclarecimentos apresentam três virtudes essenciais. A primeira, expõe o júri ao olhar dos leitores, bem como dos profissionais. Como é que um presidente de júri poderia envolver-se em obscuras observações sujeitando-se a que a sua autoridade fosse posta em causa? Para além desta transparência, como não entender o estímulo à atenção crítica que semelhante tipo de publicação comporta? Por fim, como evitar reflectir que um tal instrumento contribua para uma competição qualificativa que os Alemães designam ranking (ou o top dezasseis dos melhores arquitectos)?

Chegou o momento em que, no que respeita à crítica da arquitectura, é imperativo romper com este malefício francês que não prepara as futuras gerações de arquitectos, que não desperta a sociedade para preservar de modo suportável o património nem acolhe as audácias arquitectónicas essenciais. É preciso romper com certas condições dos críticos e com os “estados”46 feudais palacianos. É preciso acomodar os concursos e as suas críticas subsequentes às perspectivas europeias. É preciso conjugar as capacidades conceptuais (e criativas) e os sistemas de pensamento especulativo para tornar a crítica possível e pertinente. É preciso, por fim, ultrapassar esta atitude vergonhosa da crítica; o arquitecto que avalia os seus colegas, especialmente nos concursos possuiria um estatuto ambíguo, insuficientemente claro para realizar um acto de autoridade. Os Alemães, os anglo-saxões – Peter Collins chama a atenção para o facto de que “a crítica tem o mesmo direito que o arquitecto responsável pelo projecto” – apresentam a via de uma crítica mais serena e, melhor ainda, um modo de fortalecer o estudante de arquitectura, de esclarecer o cidadão bem como o responsável pela obra.|

 

tradução (do francês) de Dóris Graça Dias

 

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* O JA agradece às Editions de la Villette e ao autor do presente texto, André Sauvage, a gentil cedência do mesmo. Este integra, enquanto “Conclusão”, a obra antológica: Agnès Deboulet; Rainier Hodé; André Sauvage (dirs.). La Critique architecturale: questions, frontières, desseins. Paris : La Villette, 2008. A referida obra constitui uma recolha exclusiva dedicada à questão da crítica arquitectónica, reunindo 23 autores e textos de referência e análise crítica. (N. da R.) 

 

N.T.: A tradução das citações constantes neste texto são da inteira responsabilidade da JA.

 

1 Não consideramos, de nenhum modo, ter elaborado uma obra exaustiva; é preciso não esquecer sobretudo Jean-Pierre Epron pelos seus trabalhos e publicações acerca desta questão, em particular: Jean-Pierre Epron. Le Jugement en architecture. Paris : BRA/MELT, 1983.

 

2 Por exemplo: M. Nicolas; Richard Quincerot. Concours d’architecture 1920-1940, une qualité un projet. Genève : Université de Genève, CRAAL, 1980, p. 119.

 

3 Quanto a esta questão, v. o artigo de Frédéric Edelman que integra La Critique architecturale: “Le Monde et la critique architecturale”, p. 63-71.

 

4 Na perspectiva em que ele nos convida em “Autocritique du critique”, que integra La Critique architecturale, p. 37-51.

 

5 Daí que Bernard Huet afirme claramente que a mesma não é precisamente crítica. O seu texto integra La Critique architecturale, “Les Enjeux de la critique”, p. 76-86.

 

6 Henri Rapin. La Construction moderne. (Août 1927), p. 537

 

7 André Comte-Sponville em Une Education philosophique; já Gaston Bachelard referia, a propósito das ciências, que elas se encontravam inalteravelmente submetidas à crítica: “De facto, trata-se de expor a acção de uma história que deverá distinguir o erro e a verdade, o inerte e o activo, o pernicioso e o fecundo [...] Na história das ciências, não é necessariamente preciso compreender, mas avaliar.” Gaston Bachelard. in L’Activité racionaliste de la physique contemporaine. Paris : PUF, 1954, p. 24-26.

 

8 Luc Boltanski; Ève Chiapello. Le Nouvel esprit du capitalisme. Paris : Gallimard, 1999, p. 544.


9 Noutra área, desta vez a literária, um crítico televisivo conhecido, como Benard Pivot, defende, também ele, uma dupla perspectiva política e moral de menosprezo em relação ao meio que pressupõe uma virtude, uma forte renúncia quotidiana às solicitações e tentações de qualquer género. “Seria suficiente que, pelo menos uma vez, eu fosse suspeito de retirar benefícios da minha função para que eu perdesse de imediato a minha autoridade [...] E adoptei um modo de vida que corresponde a essa escolha: não me dou nem com escritores nem com editores; recuso todas as “misturas” [pagamentos feitos aos animadores de televisão para actividades privadas e comerciais].” Bernard Pivot. La confession do roi Lire. Le Nouvel Observateur. (7-13 juin 2001), p. 110.

 

10 Simeoforidis Allégret et Violeau (os críticos devem ser parceiros e não aliados); Valérie Devilard. Architecture et communication: les médiations architecturales dans les années quatre-vingt. Paris : Université Pantheon-Assas, 2000. 440 p.

 

11 Vide artigo que integra La Critique architecturale. “La critique architecturale: entre carcan et utilité”, p. 28-36

 

12 Vide artigo supra bem como Valérie Devilard. “Dérives médiatiques d’un système de publication professionelle 1981-1995”, que integra La Critique architecturale.

 

13 Por exemplo, o seminário do “Programme ‘risques collectifs et situations de crise’.”, CNRS, École des mines de Paris, cinquièmme session, Février de 1996, 163 p. P. 16-20.

 

14 Luc Boltanski; Ève Chiapello. Op. cit., p. 563.

 

15 Jogo de palavras intraduzível: o que é dito no original é “vaurien (vaut rien)”. (N. da T.)


16 Luc Boltanski; Ève Chiapello. Op. cit., p. 567.

 

17 Jürgen Joedicke. L’Architecture d’Aujourd’hui. Nº 117. (1964), p. 26.

 

18 Luigi Pareyson. Conversations sur esthétique. Paris : Gallimard, 1992.

 

19 Philippe Boudon. Pessac de Le Corbusier. Paris : Dunod, 1969.

 

20 Existe tradução em português: Paul Valéry. Eupalinos ou o arquitecto. Lisboa : Cavalo de Ferro, 2009. (N. da T.)

 

21 Não encontramos nós nesta passagem dos escritos de Loos uma hipótese semelhante? “Cada móvel, cada coisa, cada objecto conta uma história, a história da família. O apartamento nunca está terminado; ele desenvolver-se-á e nós desenvolver-nos-emos nele. Evidentemente, não descobrimos nele um traço de estilo. Quero eu dizer, nenhum traço de estilo estranho, de estilo antigo. Mas o apartamento terá um estilo, o dos habitantes, o da família.” [Adolf Loos. Paroles dans le vide (1897-1900). Paris : Ivrea, 1979]

 

22 “O gosto permanece bárbaro pois requer, para se satisfazer, atracções e emoções.” [Immanuel Kant. La Faculte de Juger, parágrafo 14, citado por Alain Besançon. L’Image interdite. Paris : Gallimard, 2000, p. 358. (Folio essais).] Sobre a instituição do gosto v. Jean-Pierre Epron. L’Ecole de l’académie (1671-1793) ou l’instituition du goût en architecture. Nancy : CEMPA, ENSA de Nancy, 1984. 

 

23 Para conhecer a história de John Dewey (1859-1952), pedagogo da Escola de Chicago, íntimo de George Herbert Mead, fundador da psicologia social, podemos sobretudo reportar-nos com proveito ao capítulo consagrado a este último em Lewis A. Coser. Masters of Sociological Thought: Ideas in Historial and Social Context. New York : Harcourt Brace Jovanovich, 1971.

 

24 John Dewey. Art as Experience. New York : Minton, Balch & Company, 1934.

 

25 Ibid., p. 251.

 

26 Poderíamos atribuir a esta expectativa o sentido de procura de amenidade, de encanto oferecido por um lugar. No mesmo sentido v. J. M. Montaner, que integra La Critique architecturale, “Manière et technique de la critique”, p. 123-136.

 

27 Para aprofundar esta questão, poderemos proveitosamente reportar-nos à exegese da noção “estematopia”, iniciada por Philippe Bruneau; Pierre-Yves Balut. Artistique et archéologie. Paris : PUF, 1997.


28 E do postulado kantiano segundo o qual a experiência estética seria puramente subjectiva, “não designando nada que pertença ao objecto” (Immanuel Kant. Crítica da faculdade de julgar, parágrafo 1.)

 

 

29 E se esta diferença, que outrora conduzia a uma atitude heróica – a aceitação do suplício da não remuneração do artista –, se tornou actualmente caduca pela “mercantilização” generalizada, então, terá a crítica dos nossos dias ainda um sentido sócio-crítico? Especifiquemos que a “mercantilização” na acepção de Boltanski e Chiapello designa exactamente a apropriação capitalista da diferença.

 

30 Henri Lefebvre. Le Droit à la ville. Paris : Anthropos, 1968, p. 53.

 

31 Como ultrapassagem do máximo no qual a imaginação se perde – diria Pascal. Não dirá Callois algo semelhante: “Uma obra de arte suscita o sentimento da perfeição quando o observador fascinado não consegue imaginar outra coisa senão aquilo que é, quer dizer, quando ela não lhe deixa nada para desejar.”? Roger Calois. Cohérences aventureuses. Paris : Gallimard, 1976, p. 35.

 

32 Que começa assim: “À Paris sur un cheval gris, À Issoire sur un cheval noir, À Nevers sur um cheval vert [...] (Na tradução portuguesa, que se segue, perde-se a melodia dada pela rima: “Em Paris sobre um cavalo cinzento / Em Issoire sobre um cavalo negro / Em Nevers sobre um cavalo verde [...]”) 

 

33 Martin Heidegger. L’Origine de l’œuvre d’art. Frankfurt : [s.n.], 1949. Conferência pronunciada em 1935 e traduzida em França em 1960. Há tradução em Português: A origem da obra de arte. Lisboa : Edições 70, 2007.

 

34 Peter Zumthor. Thinking Architecture. Basel : Birkhaüser, 2006. Ed. orig. em alemão em 1998/1999. V. igualmente acima Bernard Huet “interessarmo-nos pelo que a obra diz, inconscientemente, na medida em que ela foge ao seu autor”.

 

35 Estas concepções, assumidas por uma estética filosófica, encontram-se enfeudadas nos grandes sistemas do pensamento; o que após Platão, levou Souriau, para além de Hegel, a reduzir a arte à poesia, por exemplo. Implicitamente, a antropologia subjacente afirma que o homem se definiria antes e depois, unicamente, pela sua capacidade de linguagem. E é claro que assim rejeitamos radicalmente a via da semiótica tal como a formulava Roland Barthes em Le Degré zero de l’écriture. Paris : Gonthier, 1965 (O grau zero da escrita. Lisboa : Edições 70, [D.L. 1997]), afirmando: “Desde que existe sociedade, todo o uso tem sido convertido em símbolo desse mesmo uso.” Sobre estas questões da obra, v. Ricardo E. Jacobsohn. A estética comparada. Parpaings. (Mars 2001), p. 21.

 

36 Jean Gagnepain. Du vouloir dire: traité d’épistémologie des sciences humaines. Paris; Oxford : Pergamon Press, 1982. 1º vol.; Philippe Bruneau; Pierre-Yves Balut. Op. cit.

 

37 Que tentámos fundamentar e concretizar, por exemplo, em André Sauvage. Fête la ville! Urbanisme (La Ville en fête). Nº 331, p. 39-42, ou ainda C. Moreau; A. Sauvage. La Fête et les jeunes: espaces publics incertains. [S. l.] : Apogée, 2007. 

 

38 Este sublime não assume aqui o mesmo sentido que classicamente lhe confere Burke; para ele: “É causa do sublime tudo o que, de qualquer modo, suscita assombro”, em suma, ele confere-lhe um tom sobretudo psicológico. Francis D. Klingender. Le Sublime et le pittoresque. in SUR L’ART. ACTES DE LA RECHERCHE EN SCIENCES SOCIALES, Novembre 1988. Actes. Nº 75, p. 2.

 

39 Não esqueceremos o interesse que representa o ponto de vista pragmático de John Dewey. Sobre a questão da definição da obra, v. ainda, noutros registos, Daniel Guibert. L’Accès à une théorie de l’œuvre. Paris : BRA-Villemin, 1985. Arnoldo Rivkin; Pierre Caye; Jean-Marie Dancy. Constance de l’architecture (dimension esthétique de l’œuvre architecturale. Nancy : BRA-Ecole d’architecture de Nancy, 1986. Ou ainda: Jacques Fol. Qu’est-ce qu’une œuvre d’art? in Dominique Château. Arts visuels et architecture: propos à l’œuvre. Paris : L’Harmattan, 1998. Quanto a C. Grout. L’Œuvre comme événement prépolitique. Espaces Temps – Les Cahiers. Nº 78-79 (2002), p. 86-98, postula, de modo interessante, que, mais bárbara que social, a arte que se transforma numa experiência da pluralidade, pode constituir um momento fundador (sem fundação) de um viver em conjunto.

 

40 Anos compreendidos entre o final da Segunda Grande Guerra e a crise de petróleo dos anos 70 (1945-1973) considerados de grande desenvolvimento económico nos EUA, Países de Terceiro Mundo e URSS. (N. da T.)

 

41 Doutrina de docere: conduzir, guiar.

 

42 Não será necessário chegar ao ponto de postular que a concepção arquitectónica seria a obra da obra... porque, seguindo Jean-Luc Nancy, “a obra é uma acção, um movimento, uma tarefa em aberto, mais do que uma obra acabada”. Parpaings, op. cit

 

43 “Um homem verdadeiramente moderno que pretenda, por exemplo, construir uma casa possui o mesmo sentimento que teria se se fosse emparedar vivo num mausoléu.” Fredrich Nietzsche. Humain, trop humain. Paris : Gallimard, 2000, p. 49 (Folio). English Translation: Human, All Too Human. Stanford: Stanford University Press, 1995.

 

44 Sobre esta questão, reportemo-nos a Peter Collins, referido supra e Bernard Huet referido supra

 

45 Agradeço a Nicolas Michelin pela indicação que me deu.

 

46 No sentido em que Ulrich Beck. La Société du risque: sur la voie d’une autre modernité. Paris : Aubier, 2001, evoca o aluimento da crítica no período contemporâneo (deslocação dos grandes grupos estáveis, dos estados sociais e das classes).


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